Começar a correr: a conquista das famosas endorfinas
Como começar a correr? A pergunta de um milhão de passos respondida pela especialista Paula Costa Teixeira. Um treino engraçado para comemorarmos a persistência em Paraty. Links caprichados.
Olá!
Esta é A vida e a corrida, uma newsletter para entusiastas de corridas de rua, capitaneada por Ana Rüsche, com a participação de pessoas convidadas.
Hoje nosso especial traz um texto de Paula Costa Teixeira, profissional de educação física, a respeito de respeitar o próprio corpo, apontando algumas ideias para quem quer começar a correr.
Para motivar você que está se animando com a prática, compartilho um treino engraçado com uma amiga em Paraty, uma derrota alegre durante a Flip. Afinal, quase nunca de vencedores se faz uma prática longeva.
Nos links, duas matérias úteis para quem quer começar a correr.
Espero que goste e agradeço por estar conosco!
Com carinho,
Ana R.
As famosas endorfinas e o respeito ao corpo
Texto de Paula Costa Teixeira
Correr é uma ação que para algumas pessoas traz relaxamento, desestressa, renova a alma e tem gostinho de quero mais.
Para outras, isso desperta até uma revolta! Por não terem fôlego para aguentar nem dois minutos correndo, por não terem resistência cardíaca, por sentirem as canelas doloridas, por calçarem um tênis incomodando... enfim, dá até uma invejinha de quem já corre sem parar.
Correr para algumas pessoas de países da África é um meio de transporte e está na rotina semanal. Já aqui, no Brasil, a corrida pode ter outros propósitos e entender as reais intenções de seu interesse em correr é o que vai fazer com que essa prática seja sustentável e se torne um hábito na sua vida.
As famosas endorfinas precisam ser conquistadas. Não é rapidinho que surgem e se espalham felizes pelas células. É preciso perseverar e confiar no aperfeiçoamento progressivo do funcionamento do nosso corpo. As nossas células precisam aprender a produzir endorfinas e, como em todo aprendizado, algumas pessoas levam mais tempo para aprender.
Doses progressivas
Além das virtudes da perseverança e da paciência, também é preciso mencionar a disciplina, o respeito e a responsabilidade.
Disciplina é usada aqui no sentido de compreender um processo com doses progressivas:
Um dia: se vou fazer uma prática de 20 minutos, talvez corra 2 minutos de corrida a cada 4 minutos caminhando.
Depois de um ou 2 dias de descanso, esses mesmos 20 minutos podem ser ajustados para 3 minutos de corrida a cada 3 de caminhada.
Essa sabedoria de progredir com doses moderadas, que respeitam os limites e que permitem ao corpo se adaptar, par e passo, também garante uma continuidade.
A ideia de sair correndo 30 minutos direto, assim, num piscar de olhos, é ilusão e gera frustração. Por isso, é fundamental a responsabilidade com suas articulações e músculos para garantir a próxima sessão. Se a dose passa dos limites, a chance da próxima sessão não acontecer é altíssima.
Ser responsável com a história do seu corpo é se respeitar. E você merece respeito certo?
Um corpo carrega uma alma que um dia foi criança
A ideia é acabar a corrida com gostinho de quero mais, pois ajuda a próxima a acontecer de novo. E você se surpreenderá com uma versão nova sua, uma que até sente falta do exercício.
E quando você se vê correndo vários minutos consecutivos, a felicidade vem e a sensação de superação nos impulsiona a correr mais e mais. Aí mora um perigo: o risco de você exagerar e começar a enfrentar dores. É muito, mas muito comum as dores tirarem os corredores da pista, que podem até pensar de novo, "tá vendo, isso não é pra mim!"
Mas calma, pode ser apenas o corpo-mente querendo voltar à lei do menor esforço. A mente vem cutucar o físico para lembrar você que talvez ainda não esteja todo pronto para tanta corrida. Daí você pode carinhosamente acolher o sinal de dor ofertando alongamentos, fortalecimentos, massagens, compressas e logo a dor é superada. Isso é o que acontece na maioria das vezes.
Lembre-se sempre que quem corre é um corpo que carrega uma alma que um dia foi criança. Uma criança que correu de pega-pega, brincou de esconde-esconde, de amarelinha, que já teve muito fôlego e que também, às vezes, sentiu medo e precisou de amparo, abraço, carinho, principalmente naqueles momentos em que sofreu uma queda por ter tropeçado ou escorregado sem querer. Faz parte! Tá tudo bem, vai passar.
Correr com essa compreensão permite você curtir a corrida como um momento de autocuidado, para que seja feita na força da compaixão pelo seu corpo e não só pela força do ódio. Pode até ser que algumas tensões do dia estejam presentes no começo da corrida, mas quando você respira e sente seu pulsar vivo, você pode escolher transformar tudo em paz de espírito e deleitar a alma.
E o resultado da corrida? Curtir muito a sua própria companhia, a parceria com o seu corpo, sentir a brisa na pele, o seu calor revelando sua potência e a satisfação pelo fato da corrida não ter sido deixada para depois e ter acontecido no momento presente.
* * *
Paula Costa Teixeira é Doutora em Neurociências e Comportamento pelo Instituto de Psicologia da USP, onde também atua como Professora Associada e orientadora de projetos de pesquisa na área de imagem corporal, transtornos alimentares, meditação e atividade física.
Possui pós-graduação em Cuidados Integrativos pela UNIFESP, certificação em meditação por vários institutos, Aprimoramento em Transtornos Alimentares pelo AMBULIM, programa do Instituto de Psiquiatria da USP, onde também atua como colaboradora desde 2006. Profissional de Educação Física, é fundadora da iniciativa Prevenção Sem Danos e do Exercício Intuitivo.
Autora de vários capítulos de livros e obras reconhecidas no campo da psiquiatria e saúde mental. Instagram: Pratique @exerciciointuitivo e Faça @prevencao.sem.danos | Canal do YouTube | Conheça seu trabalho no site Exercício Intuitivo
🕺🏻 Na pista: um treino terrível e magnífico em Paraty
A Flip — Festa Literária Internacional de Paraty, no litoral sul do Rio de Janeiro, é um evento obrigatório para o povo da literatura. Um dos principais eventos nacionais, que aponta tendências e insere debates no mercado. Dessa forma, já fui a muitas e esse ano não seria diferente.
Ao planejar a viagem, estava bem preocupada em fazer pelo menos um treino decente durante um dos quatro dias de Flip, pois a onda de calor de novembro sequelou minhas saídas matutinas e o excesso de trabalho típico do período também não ajudou nada a manter a periodicidade que a Paula Teixeira bem pontuou acima.
Dessa forma, decidido estava: eu ia fazer pelo menos um treino em Paraty. Tênis e roupas na mala. Ainda em São Paulo, combinei com minha querida amiga Gisele Mirabai, escritora que acorda cedo, de corrermos ali no canal, onde tanta gente se exercita.
O plano parecia perfeito.
Nas pedras irregulares da cidade histórica, a coisa entornou. A onda de calor não arredou pé. Duas cervejas longneck de 300 ml numa noite me trouxeram uma ressaca horrível, uma mistura de falta de hidratação com o famoso passou dos 40. Sem esmorecer e tomando água para ver se aquilo tudo passava, levantei cedo para honrar o compromisso com a Gisele.
Lá estávamos as duas de tênis diante do canal.
Tentei. Juro. Nos primeiros minutos de trote, a desidratação dava aquela picada na tampa do crânio. Se tem algo que aprendi da pior maneira é: se sentir dor, pare. Assim, alternamos a corrida com a caminhada. Corrermos um pouco. Depois caminhamos. E corremos um pouquinho. E andamos. E fomos assim.
O que parecia ser o pior treino no mundo converteu-se numa manhã feliz, suada, cheia de barquinhos e montanhas verdes. No final, morro de orgulho da gente. Não tanto por insistir no treino, mas por não insistir quando não dá e por honrar o próprio corpo. Queria agradecer à Gisele por todo o companheirismo.
Se vou longe, também são por dias assim.
Pista: indicada para correr de dia. Av. Octávio Gama, ladeando o canal. Paraty, Rio de Janeiro (RJ).
Inspirações: links úteis para quem quer começar a correr
Esta é uma das frequentes perguntas feitas ao Google relacionada à corrida: como começar a correr?
As respostas são das mais diversas, incluindo regras loucas, principalmente para gerar cliques em artigos desportivos — como venda de monitores cardíacos e cintos de hidratação. Para você não entrar nesse buraco sem fim, fiz uma triagem de dois bons artigos:
Sascha Wingenfeld, triatleta, escreve para o site da Adidas: 8 dicas imperdíveis para quem quer começar a correr
Caio Coutinho, colaborador do site Drauzio Varella, passa algumas ideias úteis: Corrida para iniciantes — melhores maneiras para começar a correr
Sem correria e com coração
Para escrever esta newsletter voltada carinhosamente para quem quer começar a correr foram necessários muitos quilômetros de treinos intervalados, afastar pensamentos “eu não nasci para isso”, solicitar um texto bonito para a Paula, pedir para a Gisele licença para contar nossa história em Paraty e me afundar numa constelação de sites para achar links responsáveis.
Dessa forma, considere:
👟 Encaminhar essa edição para quem está começando a correr!
👟 Deixar um comentário, se você já corre, se planeja começar, sobre como você respeita o próprio corpo ou se já teve a experiência do pior-melhor treino da vida.
👟 Contar se já correu ou vai correr a São Silvestre, pauta da próxima edição!
Quem faz A vida e a corrida?
Sou Ana Rüsche, escritora e pesquisadora, entusiasta de corridas de rua. Publiquei muitos livros de poesia, romances e meu livro A telepatia são os outros (Monomito, 2019) foi finalista do Jabuti.
Faço pesquisa de pós-doutorado sobre ficção científica e mudança climática no depto. de Teoria Literária e Comparada na Universidade de São Paulo (USP). Se você possui interesse pelo tema, participe de minha atividade de divulgação científica: Filamentos, uma conversa mensal sobre livros de ficção e não ficção, organização da editora Bandeirola. Participe!
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Muito obrigada pela leitura!
Meu carinho e meu afeto,
que as nossas passadas nos levem adiante. 🧡
Minha amiga Paula Maria comentou sobre a newsletter e aqui estou! Adorei o texto sobre o treino terrível. Pra mim, estes existem para nos motivar e dar aqueles pulinhos de alegria quando o treino encaixa lindamente. Em 2024 estarei me preparando para a maratona de Porto Alegre, com muitos treinos na planilha a serem ticados :)
Adorei ❤️